VIDE: NOMES DE DEUS; NOME JESUS; MARIUS SCHNEIDER; ENSALMO
Pierre Riffard
Nomina sunt numina (fórmula latina: "os nomes são vontades celestes, das divindades")
Doutrina religiosa, ocultista, esotérica segundo a qual:
- uma coisa sem nome é uma coisa sem existência (Poema babilônico da Criação, tablete 1: "Quando no alto o céu ainda não era nomeado, e que em baixo a Terra não tinha nome...");
- cada ente, evento, estado, grau possui um nome que lhe é próprio enquanto indivíduo ou em sua espécie, resumindo sob a visão da Ideia (Gen 2,19: "Todos os animais selvagens e todos os pássaros do céu... cada um deve portar o nome que o homem lhe deu");
- o nome é a coisa, nomear se torna conhecer (O Livro dos Mortos Egípcio, os tratados gnósticos, a noção de "selo");
- o nome supõe o som, e entre coisa, som e nome, há identidade simbólica;
- se se reproduz bem o nome, o som, age-se sobre a coisa, retorna-se a sua origem, há um perigo mágico (donde o "tabu onomástico", regra proibindo a pronunciação de certas palavras porque são homônimas ou parônimas de deuses ou de chefes).
Noções filosóficas
Excertos traduzidos de "Les notions philosophiques"
A reflexão sobre o termo grego onoma, "nome", tem de cara um desafio ontológico: Heráclito e Parmênides denunciam a contradição entre o que é nomeado e as denominações dadas de modo irrefletido ou vazio. Do Crátilo de Platão aos epicuristas e aos estoicos passando por Aristóteles, a problemática do onoma resta essencialmente aquela de sua retitude: de sua relação ao pragma, à "coisa" da qual se ocupa (em retórica, pragma — de prasso = realizar —, designa o argumento de um discurso). Segundo a relação estabelecida entre onoma, o termo apelativo, e pragma, seu conteúdo, é imediata ou mediata, natural ou instituída, uma resposta diferente é dada à questão da origem da língua, logo da amplitude a acordar às etimologias, e àquela da função — mimética o diacrítica, analítica ou expressiva — da linguagem.
Roberto Pla: Evangelho de Tomé - Logion 68
- E eu lhes dei a glória que a mim me deste, para que sejam um, como nós (tu, Pai e eu) somos um (uno, na luz, no nome divino, proscrito pelo mundo); eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, a fim de que o mundo conheça que tu me enviaste, e que os amaste a eles, assim como me amaste a mim. (Jo 17:22-23)
O mesmo significado tem a proscrição do nome divino, anunciada por Lucas, como ação do mundo sobre o que não é deste mundo, que a ausência do “lugar” para os nomes do mundo proposta pelo evangelista Tomé (Evangelho de Tomé) quando diz: “Que não se encontre lugar ali onde se os tenha procurado”.
- O grego topos tem aqui o sentido de que não se encontre nada, ninguém, ali onde se os tenha procurado.
O texto de Lucas (Bem-aventurados quando vos injuriarem) fala do nome divino proscrito — não conhecido — pelo mundo, e o de Tomé (Evangelho de Tomé - Logion 68, dos nomes do mundo que há de proscrever em si mesmo o aspirante a bem-aventurado. São duas maneiras de referir-se a um mesmo ato substancial: Só é verdadeiro o nome divino, unitário, único, que o mundo aborrece; um nome que quem pretende não sere deste mundo só o pode obter mediante a negação prévia de todos os nomes plurais, não verdadeiros, deste mundo. A esta negação se referia Jesus em Renúncia.
René Guénon: NOMES PROFANOS E NOMES INICIÁTICOS''
Rama Coomaraswamy: O NOME DE JESUS
Philippe Lavastine
[René Guénon et l’actualité de la pensée traditionnelle. Actes du Colloque International de Cerisy-la-Salle: 13-20 juillet 1973]
Há quatro grandes palavras na Índia que terminam em man: ÂT-MAN, DHAR-MAN, KAR-MAN e BRAH-MAN.
Man, como em latim nomen, é originalmente o ato de nomear, o ato do notário; em man, há a ideia de ato. O notário, antes mesmo da escrita, nomeava. Essa nomeação ritual devia ser pronunciada pelo rei para tornar-se real.
Está provado de modo certo que BRAH-MAN é a fórmula sagrada que dá forma. Na primeira criação, as coisas não têm forma, ou são disformes. Há uma segunda criação, que será realizada por Indra, pelo rei.
KAR-MAN, associado ao ato notarial, é o ato criador propriamente dito — é o Verbo.
DHAR-MAN é o que sustenta tudo — é a Lei.
Quanto ao ÂT-MAN (A-TAN-MAN), perdeu-se o seu verdadeiro sentido na época em que os hindus se extraviaram. O budismo surgiu, e o Buda tinha razão ao afirmar que A-TAN-MAN não era individual. O primeiro atman é o do chefe de família, do homem adulto; é esse âtman que o Buda tentará reconstituir no sangha.
R. ALLEAU. — Dizeis que man possui o sentido de ato; há, portanto, quatro atos correspondentes a quatro níveis. A qual nível corresponde — não digo cronologicamente — o princípio e as suas consequências? O princípio seria o A-TAN-MAN, o mais elevado, ou o BRAH-MAN? Há aí uma leitura que me permanece obscura.
P. LAVASTINE. — Mencionei essas palavras apenas para mostrar até que ponto o ato é importante no pensamento da Índia. O sufixo man é, de fato, um ato, mas talvez devesse ser entendido em termos de atenção. É num certo ato de “prestar atenção” que aparece o âtman, um corpo glorioso; o âtman não é uma substância — é um ato. Foi contra essa substancialização que o Buda reagiu, e com razão.
R. ALLEAU. — Seria totalmente errado sustentar que essas quatro palavras correspondem a categorias que, por sua vez, corresponderiam também às castas?
P. LAVASTINE. — Não, aí há um mal-entendido. Quis apenas chamar a atenção para a importância dessa sílaba man, que termina quatro das palavras mais significativas da língua da Índia.