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id da página: 12873 Souzenelle – Jó no caminho da luz – Job - Iyob Annick de Souzenelle

Souzenelle Job Iyob

Annick de Souzenelle – Jó no caminho da luz


SOUZENELLE, Annick de. Job sur le chemin de la lumière. Paris: A. Michel, 1999.

A simbologia onomástica e a vocação interior
  • Da mesma forma que o nome do local de nascimento de um homem na Bíblia ressoa com a qualidade de sua terra interior, o prenome atua como ícone de seu nome secreto, contendo a informação da vocação pessoal inscrita no indivíduo, a qual só será conhecida ao tornar-se ela mesma; sob esta luz, Iyob, ou Jó, possui um destino profundamente marcado pelo seu nome, o qual carrega um chamado divino que, se não respondido, faz com que as energias reveladas se voltem contra ele e o devorem, mas se obedecido através das mutações exigidas, permite que ele alcance seu verdadeiro nome.
  • O prenome Iyob compartilha a mesma raiz da palavra hebraica Eybah, que significa inimizade, termo pronunciado pela divindade ao dirigir-se à serpente no relato da Queda no livro do Gênesis, estabelecendo assim uma inseparabilidade entre o texto de Jó e o da Gênesis, onde o discurso divino revela as consequências dos atos dos protagonistas não como punição, mas como um retorno das energias que dispunham para seu cumprimento e que foram operadas contra si mesmos.
A antropologia teológica da Queda e a estrutura do inconsciente
  • A figura de Ishah, traduzida como esposa, representa o polo inacabado da Árvore e o inconsciente de Adão, o lado feminino interior que o homem deve desposar para construir a criança divina, não se referindo à mulher biológica, mas a uma dimensão ontológica; a repetição do gesto de comer o fruto simboliza o inconsciente sendo capturado pelas seduções do mundo, confirmando a alienação humana cada vez que o indivíduo falha em se constituir como guardião de sua Adamah, a terra interior.
  • A inimizade estabelecida por Deus entre a serpente e a mulher, e entre as sementes de ambas, descreve o drama humano onde a semente da serpente, o Satanás, fere o calcanhar, símbolo da raiz da Árvore que o homem deve se tornar, enquanto a semente de Ishah, identificada como o Verbo divino no santo nome YHWH, esmaga a cabeça da serpente, assumindo a liderança do homem; Jó personifica o espaço deste combate entre as forças adversas, onde cada instante da história carrega simultaneamente o peso da Queda e a possibilidade da Redenção.
A dialética entre Inimizade e Amor na conquista da Semelhança
  • A palavra Eybah, traduzida como inimizade, pertence à mesma família etimológica de Ahabah, que significa amor, indicando que se trata essencialmente do amor divino pelo homem, este outro que é chamado a tornar-se totalmente semelhante até ser desposado por Deus; a distinção radical entre os verbos criar e fazer no Gênesis revela que criar é obra divina, enquanto fazer é obra divino-humana, sendo a conquista da semelhança o objeto da vida de Jó e a lei ontológica que exige o combate e as mutações.
  • O mistério meditado no livro de Jó refere-se fundamentalmente ao amor, cuja força é a única capaz de permitir ao homem assumir suas mutações, conforme ecoa o Cântico dos Cânticos ao afirmar que o amor é forte como a morte, sugerindo que a violência e o ciúme do amor divino tornam o ser capaz de suportar o Sheol e as chamas de fogo para elevar-se à dimensão de esposa.
A crítica à perfeição estática e a necessidade do autoconhecimento
  • A perfeição atribuída a Jó denota um estatismo que deve ser superado, pois um ser cujo amor por Deus o torna impecável perante a lei será convocado a ultrapassar o imobilismo dessa perfeição através de uma experiência de convocação divina violenta; Jó, embora considerado perfeito, não se conhece, ignorando a sentença do templo de Delfos que vincula o conhecimento de si mesmo ao conhecimento do universo e dos deuses, permanecendo distante da unidade divina onde interior e exterior se fundem.
  • A ingenuidade e fatuidade do discurso de Jó ao exaltar sua grandeza passada e suas virtudes morais demonstram sua inconsciência e distância da unidade divina, revelando que, apesar de sua impecabilidade moral e status social, sua situação é espiritualmente infantil e precária; contudo, sua retidão interior, alinhada à qualidade de Israel ou Yasher El, indica que uma coluna vertebral espiritual começou a ser construída em suas profundezas, preparando-o para entrar em ressonância com seu nome divino, muito além do conhecimento exterior da lei.
O medo sagrado, a nudez e o descenso à Adamah
  • A característica de Jó como temente a Deus reflete a relação estabelecida após a Queda, onde a nudez ontológica, que outrora significava o conhecimento do caminho a percorrer, passa a significar a ilusão do caminho percorrido e a distância vibratória entre o homem e a voz divina, gerando o temor; a humildade, etimologicamente ligada a humus e à terra úmida, apresenta-se como o estado necessário para reduzir essa distância e conduzir Jó à sua terra das profundezas, a Adamah, da qual estava cortado.
  • A afirmação divina no Gênesis de que não é bom que o homem esteja só refere-se à impossibilidade de o homem se realizar estando cortado de si mesmo e de seu lado inconsciente; portanto, o fato de Jó se desviar do mal deve ser lido ontologicamente como um desvio do inacabado, uma fuga de seu inconsciente e um desconhecimento de sua terra interior, sem a qual ele não pode trilhar o caminho das núpcias espirituais.
A lei ontológica da Mutação, Morte e Ressurreição
  • O termo hebraico para perfeição, Tom, é composto pelas mesmas letras invertidas de Met, que significa morte ou mutação, indicando que a perfeição carrega em seu nome a vocação de se voltar para a mutação, pois não há morte ontológica sem ressurreição; a integração de qualquer qualidade espiritual exige que o filho interior, ou Bar, morra para ressuscitar em uma nova terra, cumprindo a lei do grão de trigo que precisa morrer para dar fruto.
  • O processo de despojamento espiritual implica aceitar não compreender mais nada e permitir que as túnicas de pele sejam arrancadas, uma expressão que joga com a homofonia entre as palavras hebraicas para pele e luz, Or e Or, diferenciadas apenas pelas letras iniciais Ayin e Aleph; esta transição dolorosa, onde o destruidor parece arrancar a pele, é na verdade a revelação de uma luz ainda desconhecida, preparando o ser para ser revestido de luz pelo Esposo, conforme a imagem daquela que sobe do deserto.