Grande parte de seus escritos estão em um flamengo antigo. Associada com a região de Antuérpia, embora isto seja uma referência na cópia mais recente de um dos manuscritos a ela atribuídos. A maioria dos manuscritos foram encontrado próximo a Bruxelas.
Segundo Arthur Versluis, ela pertencia a ordem da Beguinas; ordem controversa pois embora pregasse a pobreza, não eram freiras oficialmente, mas pessoas comuns com seus afazeres ordinários, mas que se reuniam em uma espécie de "grupo de trabalho", à semelhança de uma tariqah sufi. Não vivendo em mosteiros, mas seguindo uma regra espiritual e guiadas por uma anciã, no caso esta era a própria Hadewijch.
Dotada de experiências visionárias desde cedo, nos conta que uma de suas visões ocorreu quando tinha apenas dezenove anos, sendo outra quando ainda não havia "amadurecido" (afirmação provavelmente de duplo sentido). É notável que estas experiências testemunham revelações espirituais através de um anjo. Ela menciona ter recebido a presença de um anjo, dos Tronos, encarregado de discernimento espiritual (diakrisis). Este passou então a ser seu guardião e companheiro em todos os caminhos. Em outra narrativa ela escreve sua imensa alegria ao experimentar a Presença divina ela mesma, a "Face" de Deus; o que a permitiu compreender o sentido da Divina-Humanidade.
Hadewijch experimenta o Divino através de mediação angélica na forma celestial que é, em última instância, ela mesma como anjo. Ela tenta passar a profundidade desta experiência relatando um diálogo com seu Anjo, que diz para ela: "Estes céus, que reverencias, são todos seus e meus; e isto que vistes como dois reinos que estavam separados eram nossas duas humanidades, antes de alcançar o pleno crescimento... Desejastes, cara heroína forte e senhora, com tuas dúvidas, conhecer de mim como se passaria, e através que trabalhos, que deveria atingir pleno crescimento para ser como eu, de modo que eu seria como ela; e tu como eu. Deixes isto estar em mim, e deixes isto ser anunciado a ti pela minha boca.; é minha compreensão de minha rica natureza" (Hadewijch: The Complete Works (Classics of Western Spirituality). Paulist Press, 1980).
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HADEWIJCH (PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XIII)
Por volta do fim do século XII e no início do XIII, desenvolveu-se, nos Países Baixos do Sul, em particular no ducado de Brabante e no principado eclesiástico de Liège, uma corrente de vida mística muito importante—chegou-se a dizer: "um movimento extático"—onde monjas e "beguinas" rivalizavam em fervor com os eremitas e as reclusas. Os inícios deste período de intensa devoção foram ilustrados, dentro dos limites de um território exíguo, por uma plêiade de santas autênticas: uma santa Marie de Oignies († 1213), uma santa Christine l'Admirable (Christine de Brutsem, † 1224), uma santa Lutgarde de Tongres († 1246), uma santa Julienne de Cornillon († 1258).
Parece que a influência de São Bernardo não foi estranha a esta recrudescência de vida espiritual, que coincidia com a rápida expansão dos Cistercienses nos Países Baixos: fundação de novas abadias ou passagem de antigas abadias sob a regra de Cister. O século XIII progredindo, sobrevieram os Franciscanos e os Dominicanos. Estes últimos possuíram muito cedo vários conventos no país dos beguinages, e não se mantiveram à margem do movimento religioso local: testemunha, entre outros, o autor do Bonum universale de apibus, Thomas de Cantimpré; ingressado nos Frades Pregadores em 1232, discípulo de Santo Alberto Magno, ele frequentou os meios místicos valões e tíos, e até se tornou o historiógrafo de três das santas contemplativas mencionadas acima. Nestas últimas, quaisquer que tenham sido os seus diretores, os traços especulativos da contemplação dionisiana mal aparecem, nem tampouco o método de introversão: o seu caminho de oração é antes uma ascensão para Deus pelo amor unificador: um amor que se apega com predileção à Humanidade de Cristo, e se eleva por aí até à união com a Santíssima Trindade.
A "irmã" Hadewijch—venerabilis virgo, beata Hadewijch—ainda pertence à linhagem espiritual que se evoca. Ela foi provavelmente uma "beguina", não uma religiosa enclausurada. De extração nobre, ela excela em dissertar sobre o amor divino, na linguagem "cortês" da época. Os seus escritos, em língua tía, compreendem um livro das "Visões", das "Cartas", e finalmente coletâneas de "poesias", onde, diz o P. van Mierlo, editor recente das suas obras, se revela uma "artista de primeiríssimo valor". As obras de Hadewijch, muito apreciadas em terra neerlandesa, foram bem conhecidas de Ruusbroec e do seu círculo: o facto deve ser notado aqui.
No ensino desta mística letrada, apenas se releva dois ou três pontos. Primeiro, que ele permanece quase ileso das influências neoplatónicas, tão evidentes em muitos medievais: nem katharsis, nem introversão metodicamente praticadas. Santo Agostinho, São Gregório Magno, São Bernardo são mencionados nas "Visões" e nas "Cartas": mas até que ponto os seus trabalhos foram conhecidos? Acreditar-se-ia também, aqui e ali, ouvir um eco indireto dos Victorinos. Empréstimos à Epistola ad Fratres de Monte Dei pareceram bastante prováveis; as "Cartas" de Hadewijch contêm até uma longa passagem que é pouco mais do que um excerto, abreviado e traduzido para o tío, do De natura et dignitate amoris de Guilherme de Saint-Thierry. No total, as influências literárias detetáveis não ultrapassam necessariamente o contributo imediato do meio espiritual, imbuído de tradição agostiniana, onde a vidente residia.
Cristológica e trinitária, a mística vivida de Hadewijch não é menos ambiciosa do que a mística codificada dos teóricos mais audaciosos. Deixa-se a palavra ao P. van Mierlo: "Nas visões (de Hadewijch) pode-se distinguir dois grandes momentos: no primeiro a alma é arrebatada em espírito, fora das impressões sensíveis...; no segundo, ela cai fora do espírito, é o momento da união plena, onde já não vê, não ouve, não sabe senão uma coisa, que é estar unida ao Amor. Parece que ela admitiu a possibilidade da visão da essência divina ainda nesta vida. Pelo menos ela afirma ter desfrutado de curtos instantes da felicidade dos eleitos" (art. cit., p. 287-288).
O P. Reypens faz remontar pelo menos até Hadewijch a tradição mística brabançona, professada na escola de Ruusbroec, referente à visão de Deus aqui na terra. Ao anunciar um estudo ulterior, ele cita algumas linhas significativas da "quinta visão"; aqui estão elas recolocadas no seu contexto imediato:
Ende die op den throen sat inden hemel seide te mi: Dese iij throne ben ic in iij personen: troen mensche, kheroubin heylighe gheest, seraphijn in mijn ghebruken daer ic al ben. Ende hi nam mi op buten den gheeste in dat ouerste ghebruken van wondere sonder redene; daer ghebroekic sijns als ic ewelehe sal. Die vre was cort ende alsic te mi seluen quam doe dede hi mi weder inden gheeste ende seide te mi aldus: Alsoe dws nv ghe-brukes salws eweleec ghebruken. Ende Johannes seide te mi: Ganc te dijnre bordenen ende god sal sijn oude wondere in di vernuwen (Hadewijch, Visioenen, ed. van Mierlo, S. J., I. Tekst en Commentaar. Leuven, 1924, p. 61-62).
Ousa-se arriscar a seguinte tradução:
"E aquele que estava sentado no trono, no Céu, me disse: Estes três tronos [quer dizer, aqui: estes três céus, figurados pelas três ordens angélicas superiores], sou eu (Deus) em três pessoas: Trono, como (Verbo) encarnado; Kheroubin, como Espírito Santo; Seraphin, na fruição [essencial] onde eu sou por inteiro. E Ele me arrebatou fora do meu espírito, até essa fruição suprema de admiração passando a razão; lá, gozei Dele como farei na eternidade. Este tempo [de extase] foi curto, e quando voltei a mim, Ele me elevou novamente em espírito, e então me disse: Como agora gozaste, assim eternamente gozarás. E [o apóstolo] João me disse: Regressa às tuas ocupações, e Deus renovará em ti as suas antigas maravilhas."
O final da "sexta visão" mereceria igualmente, parece-me, um momento de atenção: antes de restituir a vidente a este mundo de dor, o Senhor anuncia-lhe que ela obterá novamente esta fruição de todo Ele mesmo (da Sua essência), onde ela foi mergulhada (lit.: batizada) nas profundezas de Deus: daer du in ghedoept best in mine diepheit (Edit. cit., p. 70). Pensa-se nos profunda Dei que só o Espírito divino perscruta (1 Cor. II, 10). Depois de os ter vislumbrado no extase, é uma pena voltar a si: Ende ic wart met dien weder bracht iamerleke in mi seluen ("E em seguida, fui, ai de mim, trazida de volta a mim mesma", Ibid.).
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