EVANGELHO DE JESUS: BUSCAI PRIMEIRO O REINO DE DEUS
Hermenêutica
Roberto Pla
O que antes de tudo mais quer dizer o logion por meio desta miscelânea de ditos de Jesus, é que quem pretende servir dois senhores — Deus e o mundo — se comporta como aquele que se menciona na parábola do semeador e do qual se diz que a Palavra foi nele semeada “entre os espinhos”. A atenção que pode prestar uma pessoa assim resulta sempre fragmentária, intermitente, com uma oscilação inevitável do velho ao novo ou vice-versa que revela uma incompatibilidade natural de ambos gêneros. Como diz a parábola, quando se quer atender à voz da Palavra e à “sedução das riquezas”, a Palavra fica, ao final, afogada e não dá fruto.
Os “espinhos” da parábola não são outra coisa que essas riquezas ou aderências do mundo com as quais erroneamente se identifica frequentemente o homem e em especial esse tipo humano, o terceiro e superior dos três “órfãos de fruto” que descreve o relato. A terra sobre a qual foi semeada nele a Palavra não é má e o conhecimento verdadeiro poderia frutificar; mas ocorre que os acontecimentos mundanos e o desejo de proteger as riquezas psíquicas qual se tratasse de uma prolongação do “si mesmo”, são uma fonte de distração que impede sustentar na consciência de maneira estabilizada a atenção enquanto a “presença de Deus” — a Palavra — e uma e outra vez a semente, falta do cuidado adequado, se seca.
A expressão mais bem sucedida deste pensamento tão peculiar do evangelho, é a que aparece naquela perícope que é até certo ponto sinóptica de nosso logion e que trazem Mateus e Lucas: BUSCAI PRIMEIRO O REINO DE DEUS.
Lucas explica tudo isto através de uma parábola, do Administrador de injustiça. Por não haver sido atendida a importante vertente oculta pela qual discorre o relato, não gozou de muita fortuna exegética ao longo dos séculos. Talvez convenha prestar-lhe agora atenção.