A tensão (no cronotópico, no complexo tempo-espacial) devém, funciona, e o devir é o seu processo estrutural. Todo processo implica procissões ativas e passivas. Em face de outras tensões, as modificações, de que sofre o seu aspecto funcional, são o seu "devir", enquanto mantiver a estrutura, que tende a estatizar-se. Suas modificações decorrem da inter-atuação das suas partes e de outras tensões. Uma estrutura, entregue a si mesma, é impossível.
Podemos considerá-la, assim, apenas formalmente. A tensão que gera a estrutura posicional no tempo e no espaço é um modo do ser do Ser, uma possibilidade atualizada.
O constituir-se em tensão é um insistir do ser (sistere), que insiste, con-siste, re-siste, ex-siste. Todo in-sistir é um in-sistir para outrem in-sistir, por isso re-siste e, por isso, ex-siste para outrem e para si. A tensão é a coerência do in-sistir, já determinado. O ser corpóreo é tensão que se in e ex-tende (tempo e espaço).
Há coerência onde há harmonia, e há harmonia onde há contradição.
A tensão in-siste e ex-siste quando se polariza. Há polarização, quando há estrutura e função (essência e existência). O ser como tensão pura é indeterminado, e toda determinação exige contradição, re-sistência.
A tensão pura é ausência de in e ex, é tensio. Como tensio (tensão) não é estrutura nem funcionamento (não processa).
O existir (tempo-espacial) é um modo do ser. E porque é, é uma de suas possibilidades que se atualizaram.
Sua razão é dada a posteriori, pois são os fatos que apontam simbolicamente a razão de si mesmos.
Queremos uma razão suficiente antecedente e não consequente, porque estamos imersos na temporalidade.
A razão, aqui, deve vencer o cronológico, mas o que é, comprova a asserção da sua possibilidade. Logo, a tensão pode ser in e ex porque é in e ex. Para ser in e ex, é preciso insistir e resistir, porque estar é resistir.
Portanto, na tensão pura do ser, coincidem todos os opostos, porque o que é, comprova que o ser é tudo quanto pode ser, como já o compreendia, com positividade, Nicolau de Cusa. [Mário Ferreira dos Santos – Ontologia e Cosmologia]
As unidades de fato são sempre um apontar da dualidade. Na unidade são reunidos os elementos que com ela formam um todo. Essas unidades constituem uma superação sobre o mero aglomerado, porque há nelas, não apenas síncrisis (reunião) dos elementos separados, mas o surgimento de uma nova coesão do todo, que permite captar um novo esquema (uma tensão).
A síntese, que se revela aqui, aponta a unidade quando o todo constitui uma indivisão, quando assume o caráter de um indivíduo, de não-divisão (adwaita, dos hindus), com propriedades que não pertencem aos elementos componentes.
Não estamos aqui em face de uma abstração do homem, mas de uma realidade, pois a tensão revela-se quando o todo é apenas a soma das suas partes, como numa unidade de agregação (unitas aggregationis), mas é qualitativamente diferente delas, o que é propriamente a tensão. Há, na tensão, uma trans-imanência, um ultrapassar aos elementos componentes. E esta é a razão porque até em pensamentos panteísticos, encontramos uma transcendência no Grande Todo (Pan), porque se é o conjunto das suas partes, é ele qualitativamente outro.
Tal pensamento de que Deus fosse a tensão universal, encontramo-lo formulado em muitas ideias panteístas, cuja critica não cabe aqui, pois neste livro, interessamo-nos mostrar a relação entre símbolo e simbolizado, que obedece, em muitos aspectos, na escolha do símbolo, ao sentido do pensamento teológico aceito.
A tensão é para muitos uma "potência misteriosa", que leva os elementos aglomerados a assumir (assumptio) uma individualidade qualitativamente homogênea enquanto tal, embora heterogênea quanto à constituição dos elementos componentes. Essa "especificidade", (pois no todo tensional há o surgimento de uma nova espécie) é tema de estudos posteriores, como o fazemos na "Teoria Geral das Tensões."
É da experiência humana que nosso espírito caracteriza-se, também pela tendência natural a reunir as partes em totalidades tensionais. Os estudos da Gestalttheorie e de todas as tendências holistas (de holós, em gr. totalidade) já nos ofereceram suficientes elementos para confirmar tal opinião. Os fatos do mundo são contidos em unidades, e podemos ter uma visão unitária de todo o universo. "Todo o universo está contido na Unidade", dizia Pascal, reproduzindo, em outras palavras, a afirmação dos alquimistas gregos Hen to Pan, Um é o Todo, a suprema unidade do Ser, unidade suprema, fora da qual nada é. Não sofre influências exógenas; é imutável e eterna unidade de tudo, infinita por não ter o que a finitize; infinita não por privação de fim, mas por essência.
Aceitação, porém, desses atributos da Grande Mônada, nos termos que acabamos de expor, provocam inúmeras aporias e abrem caminhos a debates sobre problemática. Um ser essencialmente infinito não pode ser a soma de seres finitos. De qualquer forma deverá ser absolutamente transcendental. E eis aqui o ponto de divergência entre transcendentalistas, como os escolásticos, e panteístas em geral, como o são certos hermetistas, "esotéricos", hinduístas, etc. [Mário Ferreira dos Santos – Tratado de Simbólica]