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Modos do Ser

SER — MODOS DO SER


VIDE: MODALIDADES DO SER; ENTE

Filosofia

Arcângelo Buzzi

Aristóteles dizia:

«O ser se diz de muitos modos, mas nenhum modo diz o ser». «A palavra ser tem muitas significações» (Met. Z, 2; 1003 a 33).


Não há na história da filosofia definição mais precisa do ser que esta de Aristóteles. Em grego «modo» é egklesis, que significa inclinação para o lado. O ser não se nos dá de pé, verticalmente. Ele vem à existência como que inclinado, oblíquo, nas variações dos modos. O ser está no modo, aparece no finito, no limitado. Aí surge, permanece, consiste. No ato de surgir, de declinar-se num modo (árvore, homem, palavra) ele se anuncia, se apresenta, aparece.

O ser, ao se derramar em muitas direções, não se perde na multiplicidade. Guarda a multiplicidade na unidade de si. Ele mesmo se custodia, se preserva, se subtrai a todos os modos. Por isso é que todas as diferenças da vida vivem de uma única e inefável referência ao ser.

«Se pretendo conceber o ser como ser, fracasso inexoravelmente, caio no vazio. Só posso concebê-lo num modo determinado. Aí o ser se anuncia. Aí o busco, sem jamais alcançá-lo. Se quero saber o que é o ser: tanto mais claramente se mostra o extravio do ser para mim quanto mais inexoravelmente prossigo perguntando e quanto menos me deixo enganar por qualquer imagem construtiva do ser. Nunca tenho o ser senão que sempre tenho um ser» (Karl Jaspers, Filosofia, II, Madrid 1959, p. 355).


Não é pois possível pensar o ser diretamente. Sempre o temos, porém, em todo ente e em toda fala. Em toda fala está o «é» do ser: Pedro é bom. O papagaio está na gaiola. Esse carro é da França. O cinzeiro é de prata. Aqui tudo é paz. Nessas frases se pensa o «é» diferentemente. Em cada frase vem expresso numa significação determinada, no mais das vezes fácil de apreender. Na primeira e na última frase já é mais difícil.

Quando passamos a interpretar o «é» de cada exemplo acima mencionado, percebemos que nos diferentes «é» o ser aparece, se dá numa multiplicidade de modos. O «é» denota uma variedade de significações: «a palavra ser tem muitas significações» (Aristóteles). O ser sempre se diz numa significação, num modo.

Mas quando dizemos o «é» determinado, definido, mal nos damos conta que isso só é possível porque vivemos e falamos a partir de um anterior indefinível. O definido se constitui a partir do indefinível. A esse anterior indefinível denominamos Ser. Todos os finitos modos de ser denotam uma profundidade que os instaura no modo determinado em que estão. Aquela profundidade instauradora não é modo. É mais que os diferentes modos de seu aparecer. É simplesmente o Ser.

Se aquela profundidade instauradora, o Ser, contém em si todos os modos, então o Ser, que à primeira vista parecia a palavra mais «vazia», mais evaporada de nossa linguagem, surge como a mais rica, tão rica, que não há modo de ser nem significação de palavra que a possa conter. É o in-finito que possibilita todos os finitos de ser e de falar.

A filosofia fala do ser, diz aquilo que ele é. De fato, porém, a filosofia não faz senão perseguir o ser. A fala fixa um momento de sua perseguição, diz uma representação conseguida. O ser ele mesmo é o indizível que escapa, que não se deixa prender em nenhuma fala, embora sempre presente em toda fala, possibilitando a fala. O ser como tal é sem-palavras (v. Silêncio).