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id da página: 8707 IBN ARABI – ENGASTES DE SABEDORIA – NO VERBO DE ABRAÃO Ibn Arabi

Ibn Arabi Fusus Abraão


VIDE: SABEDORIA DOS PROFETAS

A SABEDORIA DO AMOR RAPTOR NO MUNDO DE ABRAÃO

O título tradicional do Patriarca Abraão é al-Khalil, que é geralmente traduzido como «o amigo». Ibn Arabi, no entanto, lê na palavra um dos outros significados derivados da raiz khalla, o de impregnação ou de penetração. Assim, neste contexto, o título de Abraão significa, antes, «o impregnado», impregnado, ou seja, por Deus. A amizade, portanto, é do tipo mais íntimo; na verdade, ela é, como o título do capítulo sugere, mais como o amor arrebatado pelo qual o amante é inteiramente impregnado pelo amado. O autor prossegue usando o exemplo de Abraão para ilustrar o princípio da impregnação divina em geral. Assim, o Cosmo e cada um de seus constituintes, ao ser totalmente receptivo ao Mandamento divino, é inteiramente impregnado pelo agente divino como algo implícito e não explícito, de modo que a complexidade e a multiplicidade manifestas do Cosmo ocultam a realidade de Deus que tudo permeia. Como de costume, porém, ele insiste na reciprocidade desse princípio de impregnação, uma vez que, assim como Deus está implicitamente presente na criação cósmica, também a criação está implícita e essencialmente presente em Deus.

Isso leva Ibn Arabi a apontar que os termos «Deus» e «Cosmo» são interdependentes, a noção de divindade sendo dependente da noção daquilo que O adora. Assim, nem Deus nem o Cosmo podem ser conhecidos, a não ser em relação um ao outro. Ele está dizendo, portanto, que o Cosmo não pode ser devidamente conhecido ou compreendido sem referência a Deus, nem o conceito de divindade pode ser compreendido sem referência à criação. Prosseguindo para o assunto de nossa latência essencial em divinis, ele conclui que, ao conhecer o Cosmo, Deus está conhecendo a Si mesmo, e que, ao conhecer Deus, nós, como criaturas, conhecemos a nós mesmos em essência. Assim, in aeternis, somos o conteúdo latente e essencial do conhecimento que Ele tem de Si mesmo, enquanto, no tempo e no espaço, Ele é a substância e a realidade que tudo permeia, da qual somos apenas facetas aparentes. Isso o leva a salientar que, em vista disso, não temos motivo para culpar Deus, uma vez que, na realidade, por não sermos nada além do que Ele conhece que somos, determinamos o que experimentamos ser, passado, presente ou futuro.

Ibn Arabi continua a reforçar o conceito de impregnação mútua entre Deus e o Cosmo comparando-o com o processo pelo qual o alimento consumido se torna um com o consumidor pela assimilação de suas partículas e substâncias à substância de quem o come. Assim, a divindade é a nutrição existencial do Cosmo, enquanto ele, por sua vez, é a nutrição arquetípica da autoconsciência divina. Com efeito, os dois poemas com os quais ele conclui este capítulo expressam sua ousada visão de reciprocidade de forma muito explícita, e foi esse tipo de expressão, de sua parte, de conceitos chocantes e inaceitáveis para mentes menos flexíveis, que rendeu a Ibn Arabi tanto opróbrio entre os estudiosos religiosos de sua época.