ARBERRY, A. J. Le soufisme: La mystique de l’Islam. Jean Gouillard. Paris: Editions Le Mail, 1988
Veja: versão francesa, da tradução abaixo
O século que viu nascer al-Muhasibi, al-Junaid e al-Hallaj envaidece-se de muitos outros sufis de menor envergadura mas que não deixaram de trazer cada um sua pedra ao edifício do misticismo islâmico. O menos importante não é al-Hakim al-Tirmidhi (morto em 280/893), o psicólogo do sufismo. Seu livro, hoje perdido (Khatm al-wilaya) sustentava que os santos tinham eles também um "Selo" como os profetas. Essa tese malsoante que o obrigou a fugir para pôr sua vida a salvo, será uma das fontes da teoria de Ibn 'Arabi sobre a santidade e a profecia. As dimensões deste pequeno livro nos impedem de ultrapassar uma breve evocação das figuras mestras e concluiremos este capítulo com alguns versos de Yahya b. Mu'adh de Ray no Irã (morto em 258/871), o companheiro de Abu Yazid, e de Abu 'l-Husain al-Nuri de Bagdá (morto em 295/907), o colega de al-Junaid.
Sublinhe-se, a propósito, o lugar importante tomado pela poesia mística na vida sufi. Numerosas anedotas atestam que os antigos sufis gostavam de citar poemas eróticos, de inspiração puramente profana, que interpretavam alegoricamente no sentido de seu espiritualismo passionado. Viu-se que santos como Rabi'a e Dhu 'l-Nun tinham eles mesmos composto poemas, por vezes notáveis, nos quais exprimiam seus sentimentos por meio de imagens francamente eróticas. Para bem compreender a poesia do sufismo posterior, aquele sobretudo da escola persa (a observação vale aliás igualmente para escritores tais como Ibn al-Farid e Ibn 'Arabi), não se deve nunca perder de vista a importância fundamental da alegoria erótica no pensamento sufi e a facilidade com que o sufi transpõe a metáfora profana sobre um registro divino. Yahya b. Mu'adh escreve:
O amante deleita-se a viver
Em amor com o amor;
Alguns porém, coisa estranha a dizer!
Reprovam o Amor.
Ao redor do Amor de Deus rondarei
Enquanto me restar um sopro,
Para ser seu perfeito amante
Até a hora da tumba.
Em outro poema abre um interessante vislumbre sobre o ritual sufi da dança, que, desde essa época, havia começado a animar sua existência austera e que deveria tornar-se um dia um dos traços essenciais de sua vida espiritual.
Verdade, não te encontramos,
Eis por que de nossa dança batemos o solo
Reprovar-se-á a dança
Ao vagabundo louco de Ti que sou?
Em teu vale vamos
Eis por que batemos o solo.
Alguém perguntou a Abu 'l-Husain al-Nuri, a véspera do Bairam, que vestes poria no dia seguinte. Respondeu:
Gritaram: "É amanhã a Festa"
Que vestes porás? E eu respondi:
A veste que me deu Aquele que me serviu
Muitos cálices amargos e transbordantes. A pobreza
E a paciência são meu vestuário; cobrem
Um coração que a cada festa vê seu Amante.
Há vestes mais belas para saudar o Amigo
Ou para visitá-lo que aquela que ele mesmo emprestou?
Quando Tu, o objeto de minha espera, não estás ali bem perto
Um minuto é um século de pena e de temor,
Mas quando te vejo, quando te ouço, todos
meus dias são alegres e a vida é uma festa.
Em outra circunstância al-Nuri declama:
Meu amor é tão passionado que eu languidezco
Por ter sua lembrança sem cessar presente a meu coração.
Se porém o êxtase que me queima
Pudesse consumir meus pensamentos, cegar minha memória!
E, maravilha sobre maravilha, o êxtase ele mesmo
É levado: ora perto ora longe.
Meu amante está ali; não tenho mais
Memória senão para temer e para esperar.
Os versos seguintes, atribuídos igualmente a al-Nuri, recordam estreitamente a doutrina de al-Junaid apresentada acima:
Acreditei que, morto
Ao eu na concentração, abriria
Um caminho para Ti; ai! nenhuma criatura pode
Aproximar-me de ti senão pelas vias que fixaste.
Não posso viver mais sem ti, Senhor
Tua mão está por toda parte: não posso fugir.
Vários desejaram vir a ti pela esperança,
E és tu que forjaste neles sua nobre intenção.
Eis que retranquei de mim todo pensamento
Morri a mim mesmo a fim de ser teu.
Quanto tempo ainda, Bem-Amado de meu coração? Estou esgotado.
Não posso mais suportar meu exílio.