Se entendermos o qualificador "esotérico" enquanto indicador de uma condição interior, oculta, "não-pública", da tradição cristã, é possível considerar que desde os primórdios, esta condição se apresentou na própria natureza de sua mensagem. Muitos foram aqueles no Cristianismo Primitivo que ressaltaram esta condição qualificada como elitista (muitos os chamados, pouco os escolhidos) e restrita (parábolas com interpretação dada apenas aos discípulos), da mensagem do Cristo.
Esta condição, que a tradição compartilha com as demais tradições religiosas, de um "núcleo" esotérico e uma "casca" exotérica, manteve-se com dificuldade à medida que se constituía e se instituía a Igreja, a organização que pretensamente a sustentaria, mas que formou uma casca tão espessa, onde o núcleo da mensagem se tornou quase imperceptível.
Entretanto é possível reconhecer a permanência deste núcleo esotérico ao longo do tempo, manifestando-se por vezes segundo determinadas formas, quase sempre combatidas e re-encobertas pela casca da constituição e da instituição eclesial. Nesta seção vamos apresentar alguns temas que podem ser considerados como vislumbres do fluir subterrâneo da mensagem da Tradição, no seu formato cristão; vislumbres estes que se dão graças ao emergir eventual deste fluir na superfície da história da humanidade.
Segundo Robin Amis, A Different Christianity, há duas importantes diferenças quanto a cristandade do ponto de vista esotérico, e estas são exatamente as razões porque a tradição interior pode oferecer nova esperança em um mundo conturbado. A primeira é a visão que os santos não nascem santos, mas se fazem santos. A segunda é que o processo que produz santidade envolve — e sempre envolveu — uma espécie de ciência psicológica que provê ajuda justamente para estas questões que nem a psicologia moderna nem a religião moralista moderna sabem como resolver. E a tradição interior é uma ciência no mesmo sentido que depende de confirmação experimental, ou seja, no seu próprio tipo de método experimental. Assim é dito especificamente na ideia de synergia, que significa que embora é impossível sem a redenção de Cristo, a salvação também depende de nossos próprios esforços interiores. Nesta visão, os santos, mais santificados cristãos de todos os tempos, servem como exemplos d princípio básico que somos redimidos por Nosso Senhor, mas que esta redenção se torna efetiva somente através de esforços do indivíduo. Em outras palavras, não posso maltratar meu próximo, roubar meu empregador, negar o Cristo, ignorar os requerimentos de Deus para mim... e ainda afirmar ser salvo pelo grande sacrifício de Cristo; por me comportar desta maneira estou fazendo uma galhofa da cristandade, e é justamente devido a este grande abismo entre afirmações cristãs e atuações cristãs que esta grande fé entrou em decadência no mundo moderno.
René Guénon: (LA TESIS DE RENÉ GUÉNON SOBRE LOS ORÍGENES DEL CRISTIANISMO)
Hemos tenido la audacia de afirmar que las religiones de Misterios y las iniciaciones paganas presentaban grandes similitudes con el Cristianismo de los primeros siglos : volveremos posteriormente a ello. No obstante, debemos constatar que los orígenes del Cristianismo permanecen muy misteriosos y aún hoy en día nos vemos obligados a esbozar hipótesis para intentar amueblar los sombríos lienzos de pared que subsisten en su historia primitiva.
Ciertamente no resolveremos aquí estos enigmas; nuestra ambición se limita a dar a conocer mejor una tesis que quizás explicaría algunos malentendidos y que no puede ser rechazada fácilmente si uno se esfuerza realmente en reflexionar sobre la cuestión, abandonando todo prejuicio, tanto clerical como anticlerical. Esta tesis la expresó René Guénon en sus Aperçus sur l'Esotérisme Chrétien (Ed. Traditionnelles, París, 1971):
Para que esto hubiera sido posible, habría sido necesario que la Iglesia cristiana, en los primeros tiempos, hubiera constituido una organización cerrada o reservada, en la que no todos eran admitidos indistintamente sino sólo los que poseían las cualificaciones necesarias para recibir válidamente la iniciación bajo la forma que se podría llamar "crística"; y se podría encontrar con facilidad muchos indicios que muestran que realmente ocurrió así, aunque sean por lo general incomprendidos en nuestra época y que incluso, como consecuencia de la tendencia moderna que niega el esoterismo, se busque con demasiada frecuencia de forma más o menos consciente, desviarlos de su verdadero significado.» (págs. 9 y 10).
Frithjof Schuon: CRISTIANISMO ESOTÉRICO
A seguir, após elencar algumas "manifestações" esotéricas da tradição cristã, oferecemos dois textos retirados de estudos sobre a visão de Guénon sobre a tradição cristã, o contexto do que entendia ser a Tradição Primordial.
MANIFESTAÇÕES ESOTÉRICAS DA TRADIÇÃO CRISTÃ: