Henry Corbin – História da Filosofia Islâmica
Entre os kobrawiya, a ordem criada por Najmoddin Kobra, ‘Alaoddawleh Semnani († 736/1336) ocupa lugar insigne; a brevidade das linhas que seguem poderá ser compensada com o estudo que lhe dedicamos em outro lugar. Nasceu em 659/1261 e entrou aos quinze anos como pajem a serviço de Argun, soberano mongol do Ira. Aos vinte e quatro anos, quando acampava com o exército de Argun diante de Qazvin, atravessou profunda crise espiritual. Pediu licença e consagrou-se ao sufismo durante o resto de sua vida, principalmente em Semnan (a duzentos quilômetros a leste de Teheran), onde seu mausoleu não cessou de ser lugar de peregrinação. Sua obra é considerável, tanto em arabe quanto em persa, e toda ela permanece inédita. Aprofundou a fisiologia do homem de luz, inaugurada por Najmoddin Kobra, e incluiu-a no esquema de vasta cosmogonia e cosmologia que procedem, ao que parece, em sua maior parte, de sua intuição pessoal.
Talvez convenha situar no ápice dessa obra o comentário qoranico com que se conclui a obra de Najmoddin Dayeh Razi, interrompida pela morte. É monumento da hermeneutica espiritual do Qoran, obra-prima de interioridade radical, com a qual apenas pequeno número de obras místicas do cristianismo e da gnose judaica pode ser comparado. Assim como Schiller falará dos astros de teu destino que estão em ti, assim também Semnani fala dos profetas de teu ser, para remeter cada dado dimanado de um dos profetas da tradição biblica e qoranica a um dos centros da fisiologia sutil, tipificado respectivamente por um desses profetas. A este nivel da história interior devem ser lidos e compreendidos os dados da profetologia. Cada um dos sete centros sutis está caracterizado ou anunciado por luz ou aura colorida (em ordem ascendente, de Adao até Mohammad: cinza esfumaçado, azul, vermelho, branco, amarelo, luz negra, verde-esmeralda). Quanto à cosmogonia da qual procede a formação dos órgãos sutis desta antropologia mística, ela desdobra todo sistema de princípios metafisicos a partir dos três pontos primordiais da essencia (o ser), a unitude (a vida) e a unidade (a luz): há protossubstancias (o trono ou alma do mundo, a materia-prima, a forma-prima) e há realidades primeiras (o tinteiro de luz ou Espirito santo mohammadiano, a tinta de luz ou luz mohammadiana, o cálamo, a inteligencia, etc.). Cada um desses princípios de designação simbólica intervém, em proporção escalonada, na gênese dos órgãos sutis. A obra de Semnani está repleta, ademais, de preciosas indicações autobiográficas, elementos de extraordinário diarium spirituale.