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Jean-Louis Chrétien

Filosofia Moderna – Jean-Louis Chrétien


Veja: Cristologia

O que pode a voz humana? E o que faz a palavra humana? Como o homem responde aos apelos incansáveis que, de toda parte, lhe dirigem Deus e os outros homens, e até as coisas mudas? Por essas questões, santo Agostinho, ao longo de sua obra imensa, não cessou de ser habitado, em uma meditação sempre recomeçada, e como que itinerante. Testemunha inquieta dos poderes, dos perigos e dos limites da palavra, não o foi apenas por suas análises de filósofo, de hermeneuta e de teólogo, mas também por sua carga de pregador. Entre os grandes pensadores da tradição, não há um só outro em que seja tão grande a parte da obra oral, ou, se assim se pode dizer, vocal. Não medita apenas sobre a voz, exerce-a dia após dia, até que por vezes ela se quebre ou se enrouqueça. Certamente, há os numerosos volumes de aulas de Hegel ou de Heidegger, para citar apenas estes: mas, nesse caso, trata-se de notas tomadas por estudantes, ou de uma mistura destas e de notas do próprio filósofo, não de uma verdadeira retranscrição, como é frequentemente o caso dos sermões de santo Agostinho, captados por taquígrafos, onde aparecem também as reações do auditório, gritos, aplausos, protestos, cansaço, mal-entendidos. A espontaneidade aventureira dessa palavra única nos foi muitas vezes preservada. Não se pode conhecer o timbre da voz de Agostinho, mas, através de muitas páginas, ela chega até nós de maneira singular. E mesmo os escritos o são nessa época para a voz ainda. Essa palavra, como toda palavra verdadeira, nasce da escuta, e santo Agostinho foi um perpétuo ouvinte e um constante leitor da Palavra de Deus, como testemunham essas duas obras-primas monumentais que são seus comentários dos salmos e seus tratados sobre o Evangelho de João. Escrevia para melhor ler, falava para melhor ouvir.