... o tradutor tem um papel análogo ao do intérprete em música, em oposição ao do compositor. Ele deve evidentemente ser dotado de uma certa sensibilidade às palavras e aos ritmos. Mas estamos certos de que se pode grandemente estimular e aumentar essa sensibilidade, assim como se pode desenvolver a sensibilidade musical. Um erudito francês (que admiramos) escrevia recentemente, falando dos tradutores: “Que eles se apaguem atrás dos textos e estes, se tiverem sido realmente compreendidos, falarão por si mesmos.” Mas, à parte alguns casos raros, quando se trata de proposições elementares, como “o gato caça o rato”, raras são as frases que se pode traduzir palavra por palavra de uma língua para outra. Somos quase sempre obrigados a escolher entre diversas aproximações. Não poderíamos dizer, em inglês, “Let them efface themselves behind the texts”. Seria preciso dizer, por exemplo, “They should efface themselves, leaving it to the texts to speak”. Na verdade, sempre achamos que era a nós que cabia falar, não aos textos (I have always found that it was I, not the texts, that had to do the talking). Aconteceu-nos centenas de vezes de passar horas diante de textos cujo sentido compreendíamos perfeitamente, mas que éramos incapazes de reproduzir em inglês de forma que nossa tradução não fosse apenas correta do ponto de vista do dicionário, mas que tivesse a aparência, o tom, a eloquência do original.
Waley observa que se o tradutor quer dar à sua tradução a aparência e a energia do original, ele não pode se contentar em “deixar o texto falar”. É preciso que ele mesmo fale. E quando o tradutor fala por si mesmo através de sua tradução, diz Waley, ele desempenha um papel comparável ao do intérprete em música. Waley propõe uma aproximação fecunda - pois o que faz o intérprete em música? Ele decifra a partitura, ele a explora tão exatamente e completamente quanto possível, depois reúne tudo o que encontrou para dar-lhe vida em sua execução. Toda boa tradução é, nesse sentido, uma interpretação bem-sucedida. Billeter