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Fundamentos da Doutrina Budista e a Natureza do Caminho Espiritual
- A noção de que os métodos éticos que ainda comportam a oposição entre o eu e outrem representam apenas uma fase do "caminhar com Deus" (brahma-cariyam) ou do "caminhar com a Lei" (dhamma-cariyam), não sendo o ponto final da jornada espiritual.
- A crítica à ilusão dos religiosos não completamente libertos e dos deuses que acreditam falsamente ter alcançado um estado imutável e eterno, conforme registrado no Anguttara Nikaya e no Majjhima Nikaya.
- A censura de Buda a Sariputa por limitar o ensinamento a um brâmane aos mundos inferiores de Brahma, ignorando a extensão do caminho a ser percorrido, conforme o Majjhima Nikaya.
- O princípio de que aqueles que não obtiveram a libertação total (parinirvana) mas alcançaram o estado de "não mais regressar", podem atingir a perfeição final independentemente de sua condição no outro mundo, fundamentando a autoridade de Buda como mestre de homens e deuses.
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A Tarefa Contemplativa como Estágio Final
- A definição da tarefa remanescente para religiosos e seres nos céus do Empíreo, que não seja a obtenção de estados superiores por obras meritórias, mas sim a dedicação à vida de contemplação (jhana).
- A conceituação do jhana (dhyana) como uma realização ativa e desejada de estados de ser diversos do normal, distinguindo-se radicalmente de meditação passiva ou devaneio, conforme atestado no Samyutta Nikaya Pali Dictionary.
- A descrição do jhana como uma disciplina mental árdua que confere ao adepto o domínio absoluto sobre os estados contemplativos, permitindo ascender e descender na hierarquia dos estados à vontade, conforme exemplificado no Digha-Nikaya.
- A distinção entre o yoga hindu, que implica este domínio, e experiências místicas meramente passivas e adventícias.
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Os Oito Estágios da Libertação (Vimokkha)
- A estrutura dos quatro jhanas materiais e os quatro arupa-jhanas (imateriais), formando coletivamente os oito vimokkha, acessíveis a leigos e monges, conforme detalhado no Digha-Nikaya.
- A progressão através dos estágios:
- Primeiro jhana: concentração do espírito em "uma única direção" sobre um suporte escolhido pelo mestre.
- Segundo jhana: experiência extática na qual o praticante vê a forma exterior, mas não tem mais consciência da própria forma.
- Terceiro jhana: desvanecimento do êxtase, permanecendo apenas a consciência da infinidade do poder de discriminação (vinnana).
- Sexto estado: domínio da sensação de que "nada existe" (n'atthi kinci).
- Sétimo estado: ausência de discriminação, caracterizado como um estado onde não há nem consciência nem inconsciência (sanna).
- Oitavo estado: interrupção de toda a consciência ou sensação.
- A conquista da maestria sobre estes oito graus em ordem ascendente, descendente e consecutiva, permitindo imergir e emergir de qualquer estado à vontade.
- A definição do religioso que, pela extirpação dos fluxos, penetra na liberdade da vontade (ceto vimutti) e na liberdade intelectual (panna-vimutti), sendo considerado "livre nos dois sentidos", a forma mais alta de liberdade, conforme o Digha-Nikaya e o Suttanipata.
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A Libertação Final além dos Estados Contingentes
- A compreensão de que o domínio completo da hierarquia dos estados de existência não é um fim em si, mas um meio para a libertação de todos os estados, visto que todos são contingentes, com origem e fim.
- A constatação de que, conhecendo a verdadeira natureza, prazeres e dores de qualquer estado, e o meio de evadir-se deles (nissaranam), ninguém se deliciará ou desejará neles permanecer, mesmo no estado mais elevado, conforme o Digha-Nikaya.
- O princípio de que, qualquer que seja a situação na hierarquia dos mundos, sempre resta uma outra margem a atingir, sendo a obra plenamente realizada apenas para o ser completamente liberto.
- A exposição da doutrina do Caminho do Meio (majjhena tathagato dhammam deseti) por Buda como explicação para este summum bonum.
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A Doutrina do Caminho do Meio e sua Aplicação Universal
- A caracterização do Caminho do Meio como uma doutrina de importância fundamental, com ressonâncias platônicas, aristotélicas, escolásticas, bramânicas e budistas, aplicável a todas as alternativas.
- A definição do verdadeiro "habitante do fim do mundo" (lok'anta-gu) como aquele que não está ligado à existência neste mundo nem em qualquer outro, por mais alto que seja, pois todos os seres, deuses e homens, estão presos nas correntes da morte, conforme o Samyutta Nikaya.
- A identificação dos dois extremos (anta) e a oposição de Buda ao extremista (anta-ggahika) que atribui valor absoluto a um ou outro, propondo, em vez disso, o caminho mediano como o verdadeiro "Caminhar com Deus" (brahmacariya).
- A experiência do Bodhisatta, que, após viver na abundância e depois submeter-se à mortificação da carne, compreendeu que nenhum dos extremos o conduziria ao conhecimento desejado, obtendo-o somente pelo Caminho do Meio, conforme o Vinaya.
- A aplicação do princípio à Pureza, que não se obtém somente pela virtude nem sem ela, tratando-se de ser puro não apenas do vício, mas também da virtude em si, conforme o Suttanipata.
- A rejeição de todas as teorias (ditthi), afirmações e negações, considerando que "é" (eternalismo) e "não é" (aniquilacionismo) são definições igualmente inadequadas da realidade última, conforme o Samyutta Nikaya, numa posição análoga à de Brevins, para quem "a fé é uma média entre heresias contrárias".
- A concepção atemporal do Caminho do Meio, que, se localizado no espaço, não estaria "aqui, nem além, nem entre os dois", sendo alcançado não "contando seus passos", mas em si mesmo, conforme o Udana e o Samyutta Nikaya.
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A Doutrina da Momentaneidade e a Natureza do Tempo
- A visão do tempo como uma sucessão de instantes (khana) sem duração, no qual todas as coisas surgem, existem e cessam simultaneamente, um presente que separa e dá significado ao passado e ao futuro, conforme o Anguttara Nikaya.
- A caracterização da existência de todas as coisas como momentânea (khanika), análoga ao pensamento de Heráclito, conforme a Visuddhimagga e o Dpvs.
- A oposição, através de expressões budistas como thit'ato, entre a imobilidade do Eu liberto e o caráter transitório (aniccam) de tudo o que é não-Eu.
- A implicação de que a vida transcendente e supra-lógica do Eu liberto está contida no próprio Eu, sendo a sucessão aparente de instantes meramente convencional.
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O Instante como Oportunidade para a Salvação
- A valorização do "instante" sem duração como a mais bela ocasião, sintetizada na ideia de que "é hoje o dia da salvação".
- Os elogios de Buda aos religiosos que "aproveitaram seu instante" e sua censura àqueles que o deixaram escapar, conforme o Samyutta Nikaya e o Suttanipata.
- O princípio de que quem consegue segurar um instante escapa de uma vez à sucessão temporal, sendo que para o Arahant que "expirou", o Tempo não mais existe.
- A explicação causal do Caminho do Meio, onde o desejo, ou "sede" (tanha), é o que "semeia" o ser para um porvir renovado, e é somente pensando no Meio que se evita a contaminação por qualquer extremo, conforme o Anguttara Nikaya e o Suttanipata.
- O paralelo com Platão, que, em Das Leis, descreve a necessidade de segurar o "fio de ouro da Lei comum" para evitar os puxões contrários dos desejos.
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A Ascese do Religioso como Operário Espiritual
- A designação do religioso como operário (samana), aquele que se esforça, equivalente semântico de "asceta", que não conhece repouso até tornar-se aquele que "fez o que tinha a fazer" (katakaraniyo).
- A exigência de que o religioso seja senhor de sua vontade e pensamento, e não seu joguete.
- O louvor de Buda ao religioso que, retornando da mendicância, se assenta em meditação com a resolução de não se levantar antes de se libertar dos fluxos.
- A exortação à virilidade e ao heroísmo (viriyam – andreia – virtus) do discípulo que, por pura fé, busca obter o que ainda não foi atingido, tomando a mesma resolução do Bodhisatta de perseverar até a exaustão física, se necessário, conforme o Samyutta Nikaya, o Majjhima Nikaya, o Anguttara Nikaya e o Jataka.
- As intenções do religioso: tornar-se diferente da substância mundana, extirpar a noção do "eu" e do "meu", alcançar o domínio perfeito da gnose incomunicável e ver claramente a causa e origem causal de todas as coisas.
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A Conquista da Morte e a Atitude do Arahant perante o Fim
- O desígnio original do Bodhisatta de obter a vitória sobre a morte, concretizada durante a noite do Grande Despertar, e sua subsequente abertura das "portas da imortalidade" aos outros através do ensinamento da Lei Eterna.
- A disciplina do Arahant de estar "atento à morte", refletindo sobre a mortalidade de todos os seres, incluindo os deuses, permanecendo impassível mesmo diante da morte do próprio Buda, por compreender a corrupção inerente a todos os compostos.
- O contraste entre o homem mediano e ignorante, que se lamenta ante a morte, e o discípulo ariano que, tendo extinguido os fogos do eu, espera a morte como um fim inelutável, perguntando-se apenas "como fazer o melhor uso de minha força no acontecimento que se aproxima?", conforme o Anguttara Nikaya.
- A postura serena do liberto que, já morto para o mundo, aguarda a dissolução do corpo "como um servidor espera seus salários", presciente e refletido, conforme o Theragatha.
- A segurança do discípulo ariano, mesmo se inacabado, de que, renascendo conforme seus méritos, poderá continuar seu aperfeiçoamento noutra existência.
- A proclamação tácita da vitória sobre a morte, expressa nas palavras "Ó tumba, onde está tua vitória, ó morte, onde está teu aguilhão?", que poderiam ser atribuídas a Buda ou a qualquer budista verdadeiro.
- A certeza do fim do sofrimento para aquele que já está avançado no caminho para o Nirvana, pois "em verdade, ele em breve atingirá o seu término".