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id da página: 574 Santos – Tratado de Simbólica – O Que é Simbolica Mário Ferreira dos Santos

Santos O Que é Simbolica


TEMA I — ARTIGO 1 — QUE É SIMBÓLICA?

Todos os grandes fundadores de religião foram amados, compreendidos, porque falaram em símbolos, eterna linguagem criadora.

Usamos símbolos por deficiência, mas também por proficiência.
Com símbolos, expressamos o que não poderíamos fazer de outro modo, porque, com ele, transmitimos o intransmissível, como procede o nosso inconsciente, que, por não sabermos, nem querermos ouvi-lo, segreda-nos seus ímpetos, seus desejos e seus temores, através de símbolos. E usa-os ainda para burlar a nossa censura, as inibições que impomos, e o que temeríamos sequer desejar.

E toda a natureza, em sua linguagem muda, expressa se através de símbolos, que o artista sente e vive, que o filósofo interpreta, e o cientista traduz nas grandes leis que regem os fatos do acontecer cósmico.

E o símbolo surge na arte, na linguagem das linhas, dos volumes e das cores, das tonalidades, dos sons, das harmonias, do significado analógico dos termos e dos juízos, das intenções que nem sempre despontam.

E vêmo-lo nos templos e nas liturgias de todas as religiões, nos gestos de pavor e de ânsia dos túmulos e templos, como vêmo-lo no voo esguio dos pássaros.

Falam-nos em símbolos a religião e a filosofia, a arte e a ciência, as coisas brutas e os seres vivos, os astros e os átomos, toda a gama universal do acontecer. Tudo indica, tudo aponta, tudo se refere a algo, que escapa aos nossos olhos, mas que nem sempre escapa aos nossos corações.

O símbolo é a linguagem universal do acontecer cósmico. E como poderíamos evitar que se formasse uma Simbólica?

Mas, que é Simbólica? É o estudo da gênese, desenvolvimento, vida e morte dos símbolos.

Justifica-se a Simbólica como disciplina filosófica, pois podemos considerar todas as coisas, no seu aparecer, na forma como se apresentam, como um apontar para algo ao qual elas se referem.

Nesse caso, o símbolo seria o modo de significar do ente, que sempre se refere a algo.

Símbolo é, portanto, uma subcategoria dos seres finitos, que apresentaria características similares à de valor. Seria uma das categorias intensistas, que não se devem confundir com as categorias extensistas da filosofia clássica.

Estas referem-se preferentemente aos modos extensistas de ser, enquanto as outras, como o símbolo, o valor, a tensão, etc., referem-se aos modos intensistas.1

São, para nós, categorias intensistas as seguintes:

  • Símbolo — objeto da "Simbólica";
  • Valor — objeto de "Axiologia";
  • Tensão — objeto da "Teoria Geral das Tensões";
  • Ethos — objeto da ".Ética" (o dever-ser, o sollen)
  • Esthetos — objeto da "Estética".
  • Haecceitas — Objeto da Henótica, disciplina que estuda a unicidade da unidade individual.


A justificação desta afirmativa surgirá no decorrer das nossas obras que estudam tais objetos.

É A SIMBÓLICA UMA SIMBOLOGIA?


Simbologia seria a ciência do símbolo. Poderíamos considerar a Simbólica com as características de uma verdadeira ciência.

Os escolásticos consideravam que, para caracterizar-se uma disciplina como ciência, deveria esta ter um triplo objeto material, formal-terminativo, e formal-motivo.

Como objeto material, temos todas as coisas finitas, reais ou ideais.
Como objeto formal-terminativo, que é a formalidade ou perfeição, que é considerada ou estudada pela ciência, temos a que tende à referência simbólica, ao simbolizado; em suma, a significabilidade dos seres finitos, reais-reais ou reais-ideais.

O objeto formal-motivo, que é o instrumento, pelo qual uma ciência considera o seu objeto formal, é, neste caso, o símbolo, o referente, enquanto tal.

As coisas, reais ou ideais, pertencem a várias ciências, mas por haver nelas significações a um terceiro (o simbolizado), apresentam um aspecto específico, que não é pròpriamente do âmbito das outras ciências.

A simbólica, portanto, terá de usar um método, que lhe seja peculiar.
O método de interpretar os significados dos símbolos só pode ser o dialético, que chamaremos de método dialético-simbólico, e que se funda, sobretudo, na analogia, como ainda veremos.

Neste caso, a simbólica é uma simbologia, e como disciplina filosófica procura a significabilidade dos símbolos referindo-se aos simbolizados, bem como o seu nexo e razão de ser.

A definição do símbolo, que veremos mais adiante, nos permitirá ampliar o âmbito do conceito da Simbologia como ciência filosófica, cujo objeto formal-terminativo é a significabilidade de todas as coisas, tanto no sentido de significante como de significado (simbolizabilidade).


1

As categorias aristotélicas caracterizam-se pela atualização das notas que se incluem na compreensão do conceito categorial, enquanto as categorias intensistas atualizam a extensão do mesmo conceito, dinamicamente considerada. A aplicação de ambas permite maior amplitude dialética, no sentido que damos, de maior concreção.

As categorias intensistas aparentemente podem ser reduzidas à categoria de relação. Há, certamente, relação, mas há um afirmar ontológico que ultrapassa o âmbito daquela categoria; como notaremos neste livro e em outros trabalhos nossos.