A ideia do Paracleto em filosofia iraniana
A ideia do Paracleto esteve essencialmente ligada, na história das religiões, ao Evangelho de João, mas certas descobertas destes últimos anos renovaram profundamente o estudo. Assim, a obra de Otto Betz teve o mérito de retomar desde a base a interpretação do tema: textos maniqueus em copta, literatura essênia de Qumran, corpus gnóstico reencontrado em Nag-Hammadi, tantas descobertas que, somando-se ao corpus dos escritos joaninos e à literatura religiosa judaica tardia, convidavam a retomar, sobre fundamentos novos e ampliados, o estudo do tema do Paracleto. Mas os iranólogos constatarão com pesar que o domínio que lhes é familiar permanece ausente dessas pesquisas. A falta talvez caiba, em primeiro lugar, a eles; incumbe-lhes, com efeito, preparar ao menos os materiais.
Ao propor aqui situar a ideia do Paracleto na “filosofia iraniana”, toma-se naturalmente este último termo em um sentido muito amplo, abrangendo tudo quanto podem conotar os termos falsafa, hikmat, ilahiya, 'irfan, isto é, tanto a reflexão filosófica dos teólogos quanto a dos teósofos místicos ou gnósticos, os 'orafa. Ora, a ideia joanina do Paracleto, sob seu duplo aspecto, parece ter desempenhado, nos movimentos mais representativos do pensamento iraniano desde o Islã, um papel essencial quanto à perspectiva de sua “filosofia profética” (cujo nome foi conhecido por nossos autores em sua forma grega diretamente transcrita em escrita árabe). Duplo aspecto do Paracleto, disse-se: Espírito da verdade, Espírito santo enviado do alto (portanto também um apostolos, igualmente um rasul), revelando o sentido oculto dos ensinamentos proféticos e guiando em toda a verdade, ele é o “Confortador”, o “Consolador”. Mas, ao mesmo tempo também, e conforme a etimologia, é um defensor, um intercessor (um advocatus), mas um intercessor cujo papel é o de acusador, aquele que põe em acusação o mundo das Trevas diante do limiar judicial da potência divina da Luz. Ora, assim como em Sohravardi, o Shaykh al-Ishraq, e seus discípulos, os Ishraqiun, é principalmente o primeiro aspecto que se impõe, do mesmo modo o fato de que certos pensadores xiitas iranianos, nomeadamente Haydar Amoli (século XIV) e Ibn Abi Jomhur (século XV), tenham identificado expressamente o Paracleto anunciado no Evangelho de João com o XII Imame, o Imame atualmente oculto, acarreta, entre outras consequências, o aprofundamento da perspectiva sob a qual se desdobra a filosofia profética, isto é, toda a meditação filosófica centrada no fenômeno do “Livro santo” revelado do céu. Essa perspectiva define-se pela relação entre revelação e hermenêutica (tanzil e ta'wil), exotérico (zahir) e esotérico (batin), Profeta e Imame, ciclo da profecia (nobowwat) e ciclo da walayat, etc.
Tem-se, no ponto de partida, o fato de uma hermenêutica: a tradição xiita conheceu e interpretou certo número de versículos do Evangelho de João e do Apocalipse. Parece que doravante nenhuma pesquisa exegética deveria ignorar esse fato. A investigação deve assim tomar seu ponto de partida entre os tradicionalistas xiitas. Em geral, estes últimos concordam em reconhecer, no Paracleto anunciado por Jesus, o profeta Mohammad ele mesmo (assim como anteriormente os maniqueus haviam reconhecido a manifestação do Paracleto na pessoa do profeta Mani). Quando certos teósofos xiitas transpõem ou ampliam a identificação para remetê-la ao XII Imame, trata-se de um fato novo, ou seria simplesmente um corolário da identificação precedente? Aqui, já, a interpretação xiita do capítulo XII do Apocalipse bastaria para colocar-nos no caminho. Mas há mais. Há um ponto em que se cruzam a influência de Sohravardi, cujo grande desígnio foi o de ressuscitar a teosofia dos antigos Sábios persas, e a influência do pensamento escatológico do xiismo. Esse ponto de cruzamento encontra-se em um discípulo de Mir Damad, Qotboddin Ashkevari, o qual reconhece, na pessoa do “Saoshyant” zoroastriano, aquele que os xiitas designam como o Imame esperado. Esse testemunho faz entrever ao historiador da filosofia religiosa um ciclo grandioso no qual o pensamento do Irã xiita se encurva sobre o do antigo Irã, como sob o efeito de uma norma interior que teria mantido o pensamento iraniano orientado, por vocação e desde a origem, para uma metafísica escatológica.
Enfim, em um filósofo e espiritual do século XIX, Ja‘far Kashfi, a conjunção desses movimentos determina uma obra muito vasta que, sob a rigorosidade de suas análises, desdobra-se como uma ampla epopeia metafísica do Espírito, cujo desfecho é trazido pela parusia do XII Imame. Muito mais do que uma filosofia da história, trata-se de uma historiosofia que se encontra assim instaurada, isto é, a percepção do acontecimento histórico em um nível de inteligibilidade metahistórica. Essa historiosofia comporta essencialmente a ideia de ciclos; o tempo que nela se mede é um tempo cíclico. Ora, na medida em que a parusia do XII Imame, ao mesmo tempo também Paracleto e Saoshyant, comanda a ideia dos períodos desse tempo cíclico, a filosofia iraniana encontra-se em ressonância com pensamentos surgidos no Ocidente precisamente na época mesma de Sohravardi. O reinado do Paracleto, do Espírito santo, determina, no século XII, a visão historiosófica de Joaquim de Fiore e dos joaquimitas. Sua influência, de século em século, até nossos dias mesmos, foi considerável. É o que se recordará ao terminar, indicando a afinidade quanto ao sentido das “períodos” concebidas de parte a parte, para concluir que a filosofia iraniana não somente detém um sentido que a história da filosofia não pode perder de vista, mas que ela propõe uma tarefa à filosofia em geral, não apenas aos iranianos, mas aos filósofos em absoluto. É evidente que as páginas que seguem pretendem essencialmente apenas o valor de sondagens.
- Os tradicionalistas xiitas
- Sohravardi e os Ishraqiyun
- Haydar Amoli
- Ibn Abi Jomhur Ahsai
- Qotboddin Ashkevari
- Jafar Kasfi e a filosofia paraclética